Os pais nem sempre sabem como orientar os filhos em termos profissionais. E é aqui que o Coaching vocacional pode dar uma ajuda, como explica o Mental Coach Hugo Morais, deixando dicas para os pais que estão preocupados com a futura carreira dos filhos, com sugestões sobre como os podem orientar.
Hugo Morais é um profissional da área do Coaching Vocacional que, há mais de uma década, ajuda pais e filhos a encontrarem o melhor caminho em termos profissionais.
Na primeira parte da entrevista com o Guia das Profissões, este ex-Engenheiro Civil deixou, sobretudo, dicas para os mais novos, nomeadamente de como chegar à profissão de sonho. Mas, agora, dirige-se mais para os pais, abordando a forma como podem guiar os seus filhos na direção certa da felicidade profissional.
Mas também há muitos pais que desabafam com Hugo Morais quanto às suas próprias escolhas profissionais, revelando “alguma insatisfação” com o caminho que traçaram.
“Se calhar, também precisava de um programa desses”, referem, como exemplifica o Mental Coach. Porque, na verdade, quando foi a vez de eles decidirem, não fizeram a escolha certa para o futuro.
Esse exemplo é ótimo para reforçar o papel que os pais podem desempenhar no processo de escolha dos filhos. Por isso, veja as dicas de Hugo Morais no vídeo e no texto que surge logo de seguida…
Guia das Profissões – Há muitas pessoas que estão insatisfeitas no trabalho e só o mantêm porque é preciso pagar as contas…
Hugo Morais – Eu sou um produto disso também. Podia ter ficado como Engenheiro Civil, mas não o fiz. E não mudei de um dia para o outro o meu estilo de vida porque tinha contas para pagar, tinha responsabilidades e compromissos. O que fiz foi desenvolver, em paralelo, uma atividade de que realmente gosto e sou apaixonado – e amo aquilo que faço. Mas, durante um largo período, não me era possível pura e simplesmente abandonar uma e passar para outra. Aconselho sempre a desenvolver o sonho até um ponto em que a pessoa se sinta confortável para fazer a transição.
Guia das Profissões – Portanto, é uma questão de alimentar o sonho…
Hugo Morais – Não temos de desistir do sonho só porque já estamos numa outra fase da nossa vida. Podemos desenvolvê-lo. Temos de nos dedicar a ele, com horas em que estaríamos no nosso lazer. Mas vai valer a pena, mais cedo ou mais tarde. Porque quando nós estamos a fazer por nós e a lutar pelos nossos sonhos, é onde podemos investir melhor o nosso tempo.
“A vocação não nos vai bater à porta”
Guia das Profissões – Mas o que podem os pais fazer, no âmbito da orientação vocacional dos seus filhos, para que consigam seguir a tal profissão de sonho?
Hugo Morais – Existe aqui um trabalho de comunicação que é muito importante. Há aqueles pais que querem estar tão envolvidos que acabam por fazer tudo – pesquisam, entram em contacto… E tem de haver aqui um intermédio e, acima de tudo, incutir no jovem essa motivação – quando tu souberes aquilo que queres ser, as tuas escolhas de hoje são mais fáceis para ti; e para saberes aquilo que tu queres ser, tens que te dedicar um pouco a isso. A vocação não nos vai bater à porta. E, portanto, temos que dedicar algum do nosso tempo à procura, a pesquisar, a vivenciar, a sair um pouco da nossa bolha, a ter experiências diferentes…
Guia das Profissões – E o que podem os pais fazer nesse sentido?
Hugo Morais – Os pais podem incentivá-los a fazer isso. É importante para eles descobrirem-se, estarem com outro tipo de pessoas, e explorarem coisas diferentes. Isso ao longo da vida. Quando chega a altura das decisões, os pais podem partilhar um pouco do que é o seu dia a dia no trabalho, para os filhos desmistificarem certas profissões. Há jovens que, pelas séries que veem, acham que Direito é uma coisa…
Guia das Profissões – Têm uma ideia demasiado romântica da profissão…
Hugo Morais – É. Um dos aspetos que faz parte do meu programa de Coaching é eles perceberem o que é que faz parte, verdadeiramente, dessa profissão. Por isso, às vezes, um dos exercícios é eles entrevistarem alguém que exerça a profissão que estão a ponderar. Fazem parte dessas perguntas, por exemplo: quais são as suas dificuldades, o que é que gosta menos, o que aconselharia a alguém que quer entrar nesse meio. Porque, por exemplo, eu gosto de cozinhar, mas não quer dizer que algum dia eu quisesse ser Chef – eu tenho colegas que são Chefs e sei o que é que isso implica, e o que eu gosto não é tanto que me faça querer fazer parte de tudo o que isso inclui em termos de atividade.
Guia das Profissões – Os pais devem, então, ser um apoio mais pragmático, chamando à razão e alertando para as questões mais práticas?
Hugo Morais – Esse apoio é muito importante. Mas também perceber o que é que os jovens estão a valorizar – eles valorizam coisas diferentes do que nós valorizamos. Se pensarmos em nós quando tínhamos 18 anos, também valorizávamos coisas completamente diferentes! Então, temos de perceber que aquilo que move o jovem é diferente daquilo que me move a mim – e tentar fazê-lo descer um pouco à terra. No entanto, às vezes vemos as coisas tão à nossa forma que pode estar desatualizada – e o seu sonho até pode ter muitas pernas para andar! Mas nós estamos tão desatualizados dentro do “armário das profissões” que achamos que aquela ideia não tem muito para dar. Portanto, tem de haver um certo equilíbrio entre a terra e o deixá-lo sonhar…
“Gostarmos daquilo que fazemos parece um luxo!”
Guia das Profissões – A questão da empregabilidade é um fator que preocupa muito os pais – porque, lá está, estão sempre a pensar nas questões mais práticas, em pagar as contas. Mas o que pode um pai fazer quando um filho escolhe uma área que tem poucas saídas profissionais?
Hugo Morais – A empregabilidade é um fator a ter em conta, claro que sim. Mas, por si só, fica um pouco pobre de conteúdo. Eu, por mim, era Engenheiro Civil e, em 2009, deu-se uma crise financeira e a construção parou em Portugal. Mais de 90% dos meus colegas tiveram que emigrar para conseguir trabalhar. Portanto, a empregabilidade…
Guia das Profissões – Também é volátil, muda.
Hugo Morais – Não há certezas. Mas é um fator a ter em conta e que faz parte das escolhas. Vivemos no mundo real, não nos devemos focar apenas no que é o nosso sonho desde que aquilo que nós valorizamos também tenha a ver com uma certa estabilidade. Nós gostarmos daquilo que fazemos é um fator que, muitas vezes, não entra como critério. Parece que é… um luxo! Um extra! Não faz parte da escolha. Se tiveres, ótimo! Se não tiveres, tudo bem. E eu não considero isso. Eu trabalho com os jovens exatamente para procurar um caminho, para que isso seja possível.
Guia das Profissões – Portanto, os pais devem estar menos preocupados com esse tipo de questões mais práticas, como a empregabilidade?
Hugo Morais – Estamos num mundo em que as coisas evoluem a uma certa velocidade. Torna-se difícil, hoje em dia, aceitar que esta, ou aquela área, já estejam demasiado ocupadas. Há sempre forma de fazer diferente, de te diferenciares. Portanto, a empregabilidade é um fator a ter em conta, mas existem outros mais. Porque uma pessoa pode ter um emprego, pode até ganhar bem e não ser feliz.
Guia das Profissões – Mas este equilíbrio entre o que um filho quer e o que um pai quer, é complicado. Como se pode gerir isto? Quando o nosso filho escolhe alguma coisa que nós não queríamos que ele seguisse…
Hugo Morais – Há um exercício que eu recomendo que é o debate. Há o pai e há o jovem e vão fazer um debate os dois. E há outro elemento que tem de ser um moderador, completamente isento. É um debate à séria! E cada um vai defender o seu ponto de vista. O filho vai dizer “eu gostava de escolher este curso”, e tem de justificar porquê. O pai vai ter de fazer o mesmo. Selecionam duas ou três perguntas à volta deste tema. E isto implica que exista um trabalho de pesquisa que sustente as nossas opções porque temos de as apresentar no debate.
Guia das Profissões – Cabe, portanto, ao filho convencer o pai a mudar de ideias?
Hugo Morais – Se um pai sentir que um filho verdadeiramente estudou, apresenta bons argumentos para a escolha do seu curso, torna-se difícil dizer “não, não vais”. Outra coisa é o próprio filho perceber que os seus argumentos são muito frágeis – e aí, se calhar, começa a ouvir mais o pai. Este exercício é engraçado… Por um lado, dá força ao pai para perceber a escolha do filho, que é uma coisa que quer realmente explorar, e que não tem por que dizer não. Mas há outro revês que é o filho dizer que quer Fisioterapia, mas não ter a mínima noção do que isso implica e do porquê, e ele próprio perceber que a sua escolha é muito impulsionada pelos amigos, ou por exclusão de partes.
“Basear escolhas em bons critérios ajuda a ultrapassar disciplinas mais difíceis”
Guia das Profissões – No meio disto tudo, há outra questão que preocupa muito os pais: a desmotivação nos estudos. Há muitos jovens que não se sentem motivados, até pela forma como a escola continua a funcionar, assente em métodos com os quais os jovens já não se identificam. Como é que os pais podem incentivá-los e motivá-los?
Hugo Morais – A desmotivação que existe, nos jovens, ao ponto de dizerem “já não sei porque estou a estudar determinadas matérias”, tem a ver com eles não terem uma ideia do que é que se veem a fazer. E, a partir daí, tornam-se difíceis logo as escolhas para o 10º ano. Uns vão para Humanidades porque não gostam de Matemática – é mais um critério débil e, à mínima dificuldade, não têm nenhuma força positiva onde se agarrar. Há outros que vão para Ciências porque é uma área muito abrangente e depois, quando chegar o momento, logo decidem. E, lá está, quando começam a aparecer as dificuldades, não há um porquê positivo e desmotivam.
Guia das Profissões – Então, em que devem apoiar as suas escolhas?
Hugo Morais – Primeiramente, convinha que as suas escolhas fossem baseadas em bons critérios – e isso ajuda imenso para quando aparecem as disciplinas mais difíceis, ou quando o Professor é mau, para terem uma visão. “Ok, eu vou continuar forte nisto porque é o caminho que quero seguir”. Agora, quando é por exclusão de partes, para fugir de certas coisas, à mínima dificuldade, o baralho de cartas desmorona-se por completo. Vão-se agarrar ao quê? Se a coisa está a correr mal, porque hei-de estar a insistir nisto?
“Saber o que se quer ser é um dos maiores investimentos que se pode fazer”
Guia das Profissões – A oferta formativa mudou muito nos últimos anos, sobretudo devido ao crescimento das novas tecnologias… Há muitas mais escolhas e profissões novas a aparecerem quase todos os dias. Como é que isso afeta os mais novos? Um jovem que já se sente meio perdido, não sabe bem o que quer, confrontado com tantas opções, pode acabar por se sentir ainda mais perdido…
Hugo Morais – Não posso considerar a abundância um problema. A forma como nós a encaramos é que pode ser um problema. A tecnologia é para auxiliar, não é para substituir a nossa vivência completa das coisas porque senão, o nosso autoconhecimento mirra. Mas, tal como existe muita oferta, também existe muita possibilidade de falarmos com pessoas que já lá estudaram, que já lá estiveram, pedir referências… E isso, muitas vezes, não é feito. Parece que o contacto com as pessoas é cada vez menos essencial.
Guia das Profissões – Gostava de deixar uma última mensagem, um conselho, uma sugestão, aos pais, ou aos jovens, em jeito de conclusão da nossa conversa?
Hugo Morais – Saber aquilo que se quer ser é um dos maiores investimentos que se pode fazer ao nível pessoal, ou dos filhos. A partir daí, o conforto para as nossas escolhas é muito maior – sabemos para onde estamos a caminhar.